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A comunicação literária: um olhar sobre os romances de Clemente Carlos e Benigna Uate

 

Por João Baptista


Clemente Carlos e Benigna Uate são dois escritores moçambicanos que o Tindzila recebeu no dia 23 de Agosto. Numa moderação de João Baptista, os escritores em alusão debruçaram-se em torno dos seus livros *Três primas vendidas a dinheiro vivo* e *Sujei as unhas com sangue*, publicados em 2021 e chancelados pela Inter Escolas Editores.


Se Dan Brown teve um sublime professor de simbologia e seu nome Robert Langdon aparece em todos os seus livros como protagonista, Clemente Carlos relembra o seu professor na África do Sul, que fazia apelos à leitura e, a partir da leitura, surgiu o gosto pela escrita e a primeira aparição em livro foram as três primas vendidas a dinheiro vivo, o primeiro da trilogia. Se o mote da conversa foi "comunicação literária", descodificada em Emissor (escritor) + Mensagem (obra literária) + Receptor (leitor), afinal, o que retrata esse livro? Bom, surpreende-nos o facto de o livro ter sido escrito em 10 anos, algo muitíssimo raro nos últimos tempos pela pressa que muitos têm em publicar. O romance aborda a problemática do tráfico humano, tal como o título sugere, uma denúncia à questão da exploração da mão de obra infantil, exploração das mulheres para fins de trabalho sexual forçado.


Benigna Uate, por sua vez, afirma que os seus primeiros contactos com a escrita começaram aos 8 anos. Lembra-se de ter vencido um concurso de escrita sobre a história de Eduardo Mondlane e, a seguir, sentiu que tinha um vírus da escrita. Sobre a estranheza na construção e atribuição de nomes de personagens no seu romance *Sujei as unhas com sangue*, Uate defende-se pelo facto de ela ser psicóloga e daí emprestar à literatura alguns traços comportamentais do ser humano, próprios dos estudos sobre a psicologia. Aliás, não devemos nos esquecer que, no século XIX, os estudiosos da Psicologia usavam textos narrativos não para estudar a Literatura, mas o comportamento dos personagens.


Sobre a edição do livro, tal como tem sido canção e lamúrias de vários escritores moçambicanos, os convidados do Tindzila afirmam que foi um desafio editar os seus livros e que não é nada fácil editar livro em Moçambique. E, nesse processo de edição, vem depois a questão do retorno. Falando em retorno, mesmo para trazermos de volta a este texto o conceito de comunicação literária, como foram recebidos os romances *Três primas vendidas a dinheiro vivo* e *Sujei as unhas com sangue*? Clemente Carlos e Benigna Uate trouxeram semblantes cheios de esplendor, dando a entender que muitos leitores escrevem para eles mostrando alegria e satisfação. Contudo, como qualquer outro livro, estes também recebem algumas repreensões que, numa próxima edição, os pontos levantados e anotados serão corrigidos. Falando em leitores que são os receptores das obras literárias, são estes que preenchem os espaços vazios deixados pelos escritores.



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*Sobre os dois oradores*



Clemente Carlos 



Jornalista, Professor e Escritor, formado em Jornalismo Investigativo (Immaculate College) Joanesburgo-África do Sul.


Fundador do Inglês Lusófono e especialista em tradução e interpretação, tem um livro lançado, o romance *“Três Primas vendidas a dinheiro vivo”.* Gosta de ler e escrever, pelo que já está no forno o seu segundo romance.



Benigna Uate



Psicóloga, Professora, actualmente Formadora no Instituto de formação de Professores Primários, assistente Social, Poeta e escritora. 

Tem um livro lançado, intitulado *Sujei as unhas com sangue*. Actualmente escrevendo o seu segundo livro e que será publicado brevemente.

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