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4 POEMAS DE ARMANDO ARTUR homenageado pelo Projecto Tindzila pelos 35 anos de carreira


URGÊNCIA


É urgente inventar novos atalhos.


Acender novos archotes

e descobrir novos horizontes.

É urgente quebrar o silêncio,

abrir fendas no tempo

e, passo a passo, habitar outras noites

coalhadas de pirilampos.


É urgente içar novos versos,

escalar novas metáforas

recalcadas pela angústia.

É urgente partir sem medo

e sem demora.


Para onde nascem sonhos,

buscar novas artes de

esculpir a vida.


.......


OS  FAZEDORES  DE  PROMESSAS


Como destilar verdades

nestas palavras com odor de mofo?

Até eu poderia emprestar-lhes um ar de sândalo

não fosse a febre noturna dos búzios.

Há muito que os fazedores de promessas

emigraram sem que ninguém os lembrasse

dos gestos obscenos deixados para trás.

Quantos sonhos cabem numa palavra?

Quantos sonhos cabem numa cabaça?

Diziam-me que o mundo era uma pertença de todos.

E enganaram-me quando não acreditei.

Pois as palavras já não enchem a panela de barro.

Só o inverno sabe o quão é difícil

suportar as folhas caídas nas estepes.

Mas nenhuma ausência os entristece?

Nem mesmo a dor que os alucina.


.....


CHEGAR E PARTIR


Como o Zambeze que corre

nas ribas da terra alheia,

Deslizo na geografia do teu nome


Com pressa de nunca chegar.

Mas o odor de neblina

e a calidez desta noite

lembram-me o eterno destino

de chegar e partir.


.....


(As laudas da solidão)


Cítaras e marimbas

No coração sangrado.

Inevitável é o adeus

Na aba da noite.

Poemas ditongais

Vão gotejando nas páginas

Da solidão. Cacimba.


Armando Artur


Armando Artur João (Alto Molócuè, Zambézia, 28 de Dezembro de 1962) é um poeta moçambicano.


Fez em Alto Molócuè os estudos primários. Realizou os estudos secundários em Lichinga e Beira. Estudou e abandonou o Instituto Industrial de Maputo.


É membro fundador da Associação Pan-africana de Escritores (PAWA), da qual é representante para Moçambique. Foi Secretário-Geral da Associação dos Escritores Moçambicanos. Depois de ter sido Vice-Presidente do Fundo Bibliográfico de Língua Portuguesa exerceu igualmente o cargo de Ministro da Cultura de Moçambique.


Possui obra dispersa em revistas literárias, livros didácticos, antologias e jornais nacionais, e outra traduzida e/ou publicada pelo mundo fora.


Obras


Espelho dos Dias (1986);

O Hábito das Manhãs (1990);

Estrangeiros de Nós Próprios (1996);

Os Dias em Riste (2002) – prémio Consagração FUNDAC;

A Quintessência do Ser (2004) – Prémio José Craveirinha de Literatura;

No Coração da Noite (2007);

Felizes as Águas (antologia de poemas de amor);

As Falas do Poeta;

A Reinvenção do Ser e a dor da pedra (2018);

Muery – Elegia em Si maior (2019);

Carreira


Foi Vice-presidente do Fundo Bibliográfico de Língua Portuguesa;

Foi Ministro da Cultura de Moçambique.

É Doutor Honoris Causa em Filosofia da Arte e Literatura pela Cypress International Institute University.

Fez parte do Movimento Literário Charrua.

Possui obra traduzida para o Inglês, Francês, Alemão, Finlandês, Sueco, e Árabe.

Foi membro da Comissão Nacional do Instituto Internacional da Língua Portuguesa (IILP).

Prémios


Prémio Consagração Rui de Noronha (FUNDAC) 2002;

Prémio Nacional de Literatura (2004).

Prémio BCI de Literatura (2019).


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