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Poetisa norte-americana Louise Glück leva para casa o Nobel da Literatura

A poetisa americana Louise Gluck, de 77 anos de idade, é a vencedora do Prémio Nobel de Literatura 2020, revelou nesta quinta-feira, 8, a Academia Sueca.


Glück é descrita como uma poeta autobiográfica; seu trabalho é conhecido por sua intensidade emocional e por frequentemente se basear em mitos, história ou natureza para meditar sobre experiências pessoais e a vida moderna. Ela nasceu na cidade de Nova York e foi criada em Long Island . Ela começou a sofrer de anorexia nervosa enquanto estava no colégio e mais tarde superou a doença. Ela frequentou o Sarah Lawrence College e a Columbia University, mas não obteve um diploma. Além da carreira de autora, fez carreira na academia como professora de poesia em diversas instituições.


Em seu trabalho, Glück se concentrou em iluminar aspectos do trauma , desejo e natureza. Ao explorar esses temas amplos, sua poesia tornou-se conhecida por suas expressões francas de tristeza e isolamento . Os estudiosos também se concentraram na construção de personas poéticas e na relação, em seus poemas, entre a autobiografia e o mito clássico.


Atualmente, Glück é professora adjunto e escritora residente da Rosenkranz na Universidade de Yale. Ela mora em Cambridge, Massachusetts. 

Dois poemas da Glück

O Poder de Circe

Nunca transformei ninguém em porco.
Algumas pessoas são porcos; faço-os
parecerem-se a porcos.

Estou farta do vosso mundo
que permite que o exterior disfarce o interior.

Os teus homens não eram maus;
uma vida indisciplinada
fez-lhes isso. Como porcos,

sob o meu cuidado
e das minhas ajudantes,
tornaram-se mais dóceis.

Depois reverti o encanto,
mostrando-te a minha boa vontade
e o meu poder. Eu vi

que poderíamos ser aqui felizes,
como o são os homens e as mulheres
de exigências simples. Ao mesmo tempo,

previ a tua partida,
os teus homens, com a minha ajuda, sujeitando
o mar ruidoso e sobressaltado. Pensas

que algumas lágrimas me perturbam? Meu amigo,
toda a feiticeira tem
um coração pragmático; ninguém

vê o essencial que não possa
enfrentar os limites. Se apenas te quisesse ter
podia ter-te aprisionado.

*Poema publicado originalmente na coletânea Meadowlands (1996), com o título “Circe’s Power”. Editado em Portugal na antologia Rosa do Mundo. 2001 Poemas Para o Futuro (2001), da Assírio & Alvim, numa tradução de José Alberto Oliveira. A antologia encontra-se atualmente esgotada

Paisagem/3

Nos fins do outono uma rapariga deitou fogo
a um trigal. O outono

fora muito seco; o campo
ardeu como palha.

Depois não sobrou nada.
Se o atravessávamos, não víamos nada.

Nada havia para colher, para cheirar.
Os cavalos não compreendem –

Onde está o campo, parecem dizer.
Como tu ou eu a perguntar
onde está a nossa casa.

Ninguém sabe responder-lhes.
Não sobra nada;
resta-nos esperar, a bem do lavrador,
que o seguro pague.

É como perder um ano de vida.
Em que perderias um ano da tua vida?

Mais tarde regressas ao velho lugar –
só restam cinzas: negrume e vazio.

Pensas: como pude viver aqui?

Mas na altura era diferente,
mesmo no último verão. A terra agia
como se nada de mal pudesse acontecer-lhe.

Um único fósforo foi quanto bastou.
Mas no momento certo – teve de ser no momento certo.

O campo crestado, seco –
a morte já a postos
por assim dizer.

*Terceira parte do poema Landscape, de Averno (2006), traduzido por Rui Pires Cabral. Os versos foram publicados no n.º 12 da revista Telhados de Vidro, da editora Averno, em maio de 2009. 

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