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Quatro poemas do Álvaro dos Reis que desnudam algumas verdades.

Queixa
Mama,
Ouvimos tumultos e gritos
Vindo de zimpeto, jardim, matendene
e outros bairros circunvizinhos
transpirando terrores causados pelos filhos da puta dessa pátria.

As vozes queixavam-se mama
porque sequestrava-se jovens
e batia-se nas nossas mulheres
e ainda vandalizavam
as nossas infra-estruturas

Eles, sem identidade
Tiram-nos a paz em nome da pátria
E os que deviam nos defender
Nada fizeram minha mãe


Greve Silencioso


Irmãos,
Irmãs,
Amanhã de manhã, não precisamos ir trabalhar
Lá em cima há maningue tiros
Morem irmãos de pele irmãs de sangue e parentes da pátria.

Eles nada dizem,
desfilam em seus carros
rugindo a ganância nas estradas das cidades
Mas lá...
Lá em cima há maningue tiros
As balas caem como granidos e matam...

Irmãos,
Irmãs,
Amanhã de manhã ninguém vai trabalhar
Fiquemos nas nossas casas rogando como fez
Craveirinha que a Maria reze pelos homens todos
pelas crianças todas que tão cedo se lhe rouba
a infância pelos camponeses sem campos
pelos órfãos e pelas prostitutas.

Irmãos e irmãs
Amanhã de manhã,
enquanto a alma subsistir
roguemos aos deuses africanos
aos deuses gregos e dos romanos somente amanhã de manhã
Eles vão saber que esta pátria amada também é nossa. 8/2/2020


Presidente


Eu sou a pedra angular que edifica o teu palácio
Mas tu arrancas-me para longe do teu quintal
Será que não sabes que a casa pode cair?

Eu sou o contista que conta as contas e os contadores da tua riqueza
para te tornares o fidalgo dessas terras exorcizadas
pelo teu rácio irracional
que se alimenta diariamente enquanto eu e o irmão lá fora
passamos a fome e dormimos nas caixas
e camas rolantes

Enquanto isso,
os seus esbanjam as nossas forças
escravizam as nossas almas
e manipulam o nosso intelecto
reduzindo as nossas esperanças
de uma paz efectiva nessa terra amada
novamente, como dantes, armada!

Será que se esqueceram
que é do povo o poder de preconizar os seus senhores e submissores?

Os seus vandalizam-nos
e corrompem as nossas vidas
em desleais leis.

Leis...
Leis são limites
lamentáveis da vossa libertinagem
lacunas léxicas e legítimas da vossa
lastimável corrupção
conceitos controversos que criterizam a nossa condenação.
Álvaro dos Reis


Todo poeta que se preza

Não faz versos por encomendas
Esse pseudopoeta que se despreza inventa poemas por troca de moedas

poesia sentida
que nasce das profundezas da alma
dizem eles: "ninguém compreende o sentido e é preciso saber sentir..."

Sentimentos são para quem tem alma que mesmo cego,
sabe contemplar a beleza
da renovação das estações do tempo.



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