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Era uma vez num lugar que ficava nos arredores duma grande cidade amplamente habitada,
densamente povoada que fervilhava de vida.
Com a grande
concentração de pessoas num só sítio, havia uma procura intensa, constante e
incansável pela satisfação das inúmeras necessidades que surgiam no seu
quotidiano.
A cada dia que
nascia a demanda pelo bem-estar e uma vida desfrutada na sua inteira plenitude
era o lema de cada residente daquela metrópole.
A única saída para
suprir as inúmeras necessidades que aqueles citadinos enfrentavam, passava necessariamente
pela construção de grandes empreendimentos. A construção desses empreendimentos
abria espaço para que se pudesse facilmente dar cobro ou minimizar-se qualquer
demanda.
Aqueles citadinos
passavam por necessidades no tocante à alimentação, habitação, transporte,
entre outras necessidades. Certo porém, nenhuma daquelas necessidades seria
solúvel sem que tivessem que passar pela industrialização. A ser feita, ela
tinha que ser em grande escala.
Desprovidos de
qualquer outra alternativa e com o aumento dos habitantes daquela cidade, tornava-se
urgente a adopção de estratégias que pudessem ir ao encontro das preocupações
dos residentes.
Com muita urgência
foram erguidas algumas fábricas.
Por causa da crescente
procura, alguns princípios básicos não foram acautelados devidamente no
processo da projecção e consequentemente da construção da maior parte dos
empreendimentos.
O maior enfoque
dos projectistas, administradores e governantes estava voltado a resolver os
problemas gritantes sobre o que fazia falta. Contudo, construir parques e
jardins dentro da grande cidade não fazia parte das agendas dos projectistas e
construtores. O pior era que pouco valor ou mesmo nada, era feito em relação às
árvores ou pequenas concentrações delas.
O ritmo que a vida
levava naquela cidade nunca deveria ser posto em causa. Os hábitos dos
citadinos cresciam exponencialmente em paralelo com as capacidades de
imaginação e materialização das metas estabelecidas. Acompanhando a
disponibilidade da mão-de-obra capacitada e à resposta tecnológica. Tudo estava
ao alcance dos citadinos pronto para ir respondendo paulatinamente aos ensejos
da população residente naquela metrópole.
Factores
ambientais e ecológicos nunca puderam fazer parte do processo de projecção e da
construção das mini, mega e giga fábricas. As pequenas e grandes fábricas eram
construídas para que cada uma pudesse responder a cada problema em específico.
A resolução dos
problemas que apoquentavam os citadinos da grande cidade que dia após dia se
estava transformando numa gigantesca metrópole, estavam ganhando alguma
sustentabilidade. Porém, a solução de alguns problemas era proporcional ao
surgimento de outros problemas. Pequenos ou grandes, o certo era que se tratava
de problemas emergindo.
Alguns problemas
surgiam insignificantes e iam crescendo com o passar dos tempos. Negligenciados
ou ignorados, se transformavam em casos bicudos de tirar o sono aos moradores.
Outros manifestavam-se já gigantescos logo no seu aparecimento.
Uma das fábricas
erguidas foi bem perto de um arvoredo cheio de vida e exuberância.
Uma das árvores
estava bem encostada a uma daquelas árvores que fazia parte daquele arvoredo de
verdor pujante. Os seus ramos roçavam com bastante frequência às paredes duras
do majestoso empreendimento.
Devido a acção do
vento, as folhas se agitavam incessantemente, e seus rebordos exteriores
carcomiam-se desgastados pelo contacto duro e severo nas paredes rígidas do
empreendimento. O limbo daquelas folhas perdia o viço, endurecia-se e ficava
bastante esbranquiçado. Quando perdiam a sua forma luxuriante, as folhas mais
se assemelhava a pedaços de ramos secos.
Outras folhas mais
acima, livres daquele martírio, espalhavam convites aos transeuntes que
passavam com frequência pelas ruas adjacentes para que pudessem repousar nas
suas belas sombras.
Eram convites que
não apenas se circunscreviam a desfrutar da sombra compacta, mas também era
para que escutassem a sua música e ainda para que assistissem à sua dança quando
fossem acariciadas pelo vento abundante.
As folhas do
arvoredo estavam cheias de vida, verdor vivo e chamativo, reluziam cintilantes
como diamantes. Libertando odores aromáticos, eram uma verdadeira fonte de inspiração,
sossego e alegria.
Estar sob a sua
sombra por vezes significava recobrar-se dos desaforos da vida. Em paralelo
também significava desfrutar aprazivelmente os momentos de lazer e de
relaxamento.
O espaço daquele
arvoredo era bastante apreciado e frequentado pela maioria das pessoas daquela
urbe que chegavam movidos pela vontade de respirar um ar bem respirável e
fresco. Chegavam para deleitarem-se da frescura de uma boa sombra.
Do jeito que as
coisas foram sendo feitas naquele cantinho, dava a ideia de que até aquele
pequeno espaço perdia o seu valor quando fosse comparado aos sonhos e projectos
dos residentes da urbe.
Alguns até
admitiam que perdendo o pequeno canto que por muitos já era visto como
paradisíaco era mal menor quando equiparado com o valor das infra-estruturas
que seriam erguidas no seu lugar ou muito próximas dali.
Tudo corria bem e
sem sobressaltos até que um dia tudo mudou. Uma linda folha brotava vistosa e
muito viçosa. Suas cores, ainda tenrinha, irradiavam muita vida e boa saúde.
Aos poucos aquela folha ia ganhando o verdor, a elasticidade, o brilho próprio
de uma folha saudável e pronta para se exibir e dançar ao ritmo do vento
circulante e acariciador.
Tudo se projectava
fulgurante por aqueles dias. Enumeras razões haviam para tal: O recinto já
apresentava novo aspecto, sendo de muita limpeza; as ruas que davam acesso ao
local tinham sido ampliadas; gente especializada tinha sido afecta para cuidar
do ambiente no local; as plantas não só contavam com a água da chuva para a
irrigação, mas com sistemas automatizados para o controle da humidade do solo;
entre outras acções de beneficiação naquele pedacinho de terra.
Tudo indicava que
estavam criados e concluídos todos os preparativos para a entrada em
funcionamento do novo e gigantesco empreendimento. Com o funcionamento a infra-estrutura
contribuiria para a criação de uma nova dinâmica na vida da maior parte dos
citadinos daquela urbe.
Já circulavam
informações que davam conta sobre a data de inauguração do empreendimento.
Aquela folha e
tantas outras preparavam-se para que de forma nobre e mestra pudessem brindar
aos presentes no local com o brilho luxuriante, sombra, baile descompassado e
som farfalhante propiciados pela acção do vento.
A primeira má
impressão depois da cerimónia foi a de que foram pouquíssimos os participantes
que tiveram o honorável zelo de cuidar do local. Muitos partiram deixando
grandes sinais de falta de valorização de tudo quanto fazia parte daquele que
até se devia considerar de grande monumento.
Deixaram papéis,
plásticos, garrafas e outros detritos que apenas se tornavam uma mancha para
aquele sítio lindo. Os mais ousados e desprovidos de vergonha e pudor, até
satisfizeram das mais variadas necessidades naquele recinto restrito.
Por dias já não se
podia falar de bom lugar e inspirador, mas sim de um cantinho perto da fábrica.
Quando a cerimónia
de baptismo e inauguração da fábrica estava começando, foi também o momento da
grande surpresa para as folhas da majestosa árvore de encantos. Foi o momento
do grande desaire.
O grande responsável
que orientou a cerimónia, teve que dar arranque ao processo de funcionamento do
empreendimento, ligando o motor que para além de gerar toda a força motriz
daquela gigantesca unidade fabril, também era ao mesmo tempo, o coração da
mesma.
O motor começou a
roncar, fumando sossegadamente o seu cachimbo. Expelia quantidades de fumo e
alguma quantidade de calor.
Aquela folha linda
e todas que estavam à volta dela e no mesmo ramo, recebia em primeiríssima mão
as baforadas e infelizmente sem que tivessem a capacidade de se reposicionarem.
Aquela folha
nascera para viver um ciclo por um tempo determinado. Durante o ciclo tinha uma
certa missão a cumprir. O novo ambiente era bastante hostil ao cumprimento da
sua missão.
Cada roncar do
motor implicava mais baforadas para as folhas. Num curto espaço de tempo, todas
aquelas folhas cheias de vida e beleza começaram a perder as suas forças e até
o vento não conseguia reanima-las com a sua carícia devido ao peso acrescentado.
As folhas
coitadas, de verde se transformavam em alaranjadas em alguns pontinhos.
Basicamente ficavam com a cor preta por causa do fumo que se depositava
continuamente. O calor frequente que as causticava roubava-lhes o viço,
deixando-as curvadas para baixo, sem ânimo e sem esplendor.
A sua fulgência
era recorrentemente usurpada pelo calor e a fuligem. A fuligem impediam que as
folhas pudessem fazer livremente as trocas químicas com outros intervenientes
ambientais.
Todas as folhas
quase se iam expondo à mesma derrocada. Mais dias ou menos dias a sorte
daquelas folhas estava se tornado incerta ou obscura.
Ouviam
repetidamente e com grande desespero os operários categóricos afirmando:
- Dê mais gás para
maior produção. O bem-estar dos citadinos depende do ritmo da nossa produção.
Cada aceleração do
motor, implicava aceleração do período de vida daquelas folhas.
As folhas, quase
sem voz, lamentavam inaudivelmente a sua sorte bastante negra, dizendo:
- Esta é a nossa
pior sorte! A sorte de estarmos no lugar errado e no momento errado.
Queriam estar num
outro lugar, mas a sorte do destino as tinha colocado naquele lugar. Era a
mesma sorte de destino que havia determinado que não pudessem ser ouvidas
gritando, mas sofrendo e morrendo por causa do mesmo destino.
Aquela folha que
havia nascido linda e viçosa também teve a lamentável sorte e o infortúnio de
chorar o seu destino insólito.
- Quando
desabrochei e o primeiro raio de luz me tocou, senti que tinha aparecido para
um mundo lindo e sereno. – Comentou a lamentar a folha.
- Olhando para as
folhas que haviam desabrochado antes de mim, crescia com grande inveja de
querer me tornar igual a elas. – Rematou a folha.
As folhas estavam
atravessando momentos críticos. Era o seu momento de inglória depois de terem
nascido na esperança de brindarem às pessoas e à terra com frescura, aroma e ar
respirável.
Com aquela
desgraça se acentuando dia após dia, não restava mais nada que não fosse
esmorecerem, despegarem-se da ramagem e despencarem para o solo.
Aquela linda folha
que ainda não tinha atingido a plenitude do seu amadurecimento como folha, a
sorte dela se podia dizer que era a mais lamentável:
- Quando sentia
que estava caindo na agonia porque mesmo querendo continuar a viver não estava
tendo sucessos, ainda restava-me tempo e espaço para mais algum desejo –
Continuou lamentando a folha a cair.
- Julgava porém,
que a minha utilidade não se resumia apenas em oferecer sombra – começou aquela
folha o seu discurso em momento de desespero. – Julgava ainda que podia ser
útil em outras áreas de utilidade para a terra e os homens.
Eram lamúrias de
uma folha que infelizmente no lugar de viver para bem servir, tinha que morrer
porque inconscientemente alguém tinha determinado essa sua sorte infeliz. No
lugar de oferecer os seus bons serviços, estava involuntariamente a ser
empurrada para o incomum e indesejável.
Caiu desesperada e
o seu rumo era determinado pala força do vento. Caiu na esperança de estrumar a
terra. Com a terra estrumada, ficaria garantido que a terra ficasse mais
enriquecida e pronta para gerar novas plantas e nutrir a vida na terra.
- Cai na esperança
de que seria valorizada estrumando a terra e a terra geraria mais vida –
continuou lamentando aquela folha agora rolando no chão seco, frio ou quente e
duro.
- Passei dias
envolto em tristeza, no desespero e a única coisa que me consolava, por vezes,
era a esperança de ser levado para o campo onde iria servir de estrume.
Quando os agentes
de limpeza apareciam, reviravam aquelas folhas deitadas no chão e depois
comentavam todos bem cheios de vaidade:
- Que futilidade!
Não valem nada. Não vale a pena levá-las para os campos porque serão um veneno
para as culturas e posteriormente perigo para a saúde das pessoas!
- O único lugar
que lhes merece é a incineração! – Continuavam comentando desinteressadamente
os agentes de limpeza.
- Quando ouvi “
incineração” disse para mim mesma: será
que mereço esse castigo dos infernos? Terei cometido algum pecado por ter
vindo ao mundo para merecer tamanho castigo? – Torturava-se aquela folha com
cada pergunta na busca de algum consolo.
Aquela folha não
podia deixar-se relaxar porque a pior sorte podia estar a espreita. Os agentes
de limpeza estavam a juntar todas as folhas que as classificavam de
emprestáveis para a posterior canalização às incineradoras.
Seriam levadas num
camião basculante grande e estariam misturadas com outros detritos nocivos e
considerados perigosos para a saúde humana.
- Como podem
considerar-me de nociva se o que me aconteceu não foi por culpa dolosa? –
Insistia com as suas perguntas de imenso desespero a folha. – Se a questão
determinante está relacionada com alguém culpado, há que admitir que alguém
tinha que estar no meu lugar.
- Estou
decididamente resolvida a ter um destino que pelo menos me traga algum consolo
– comentou a folha.
Ao declarar
aquilo, a folha totalmente desesperada e ajudada pelo vento, seu grande amigo
de longa data, deu inúmeros reboliços naquele chão duro, insensível e cruel.
Por vezes muito frio ou às vezes muito quente. Não tinha nada de macio que se
podia equiparar à caricia do vento.
A folha rolou
tanto, afastando-se daquele lugar infame até não mais poder. Atravessou ruas
bastante movimentadas. Rolou até se encaixar numa pedra pesada que lhe esbarrou
a passagem. Ficou presa na pedra, mas não era o seu destino preferido.
Podia sonhar com
estar num campo para ser parte do estrume que podia enriquecer os campos, mas
não tinha nenhuma força motriz que pudesse determinar a chegada ao destino
predefinido.
A mercê do vento,
aquela folha foi arrancada do lugar onde tinha sido forçada a se encaixar e de
novo teve que ir parar à estrada alcatroada.
Devido ao calor
escaldante, no momento em que a folha voltou a rolar, galgando a estrada
tórrida, o alcatrão se encontrava derretido e serviu de armadilha que mais uma
vez impediu, inviabilizando a maratona da folha infeliz.
A folha foi
obrigada a interrompeu a sua viagem aventureira porque acabou ficando colada ao
asfalto calcinante.
A corrente do
vento acabava tendo um efeito que prejudicava a folha e encurtava os seus
sonhos mais nobres. Mais pontos da folham ficaram coladas ao asfalto pegajoso.
As rodas dos
carros que passavam pelo locar acabavam dando um golpe final a uma existência
cheia de sonhos. A folha acabaria ficando mais colada e sempre que o alcatrão se
derretia devido ao elevado calor, engolia paulatinamente a folha até não mais
ser notar a sua presença.
Aquela folha tinha
suportado o sacrifício de ter nascido e crescido num espaço impróprio. Por
causa disso a sua vida e existência tinham acabado se tornando numa péssima
miragem. Seus sonhos se tornaram irreais, mas não pela sua vontade senão pela
sorte do destino. Mas será que os sonhos dos mentores daquelas iniciativas revolucionárias
teriam sustentabilidade caso continuassem a ignorar a sustentabilidade
ambiental?
Se os sonhos
daqueles mentores estavam afectando os sonhos das folhas das árvores daquela urbe,
era ilógico que construíssem empreendimentos em nome da realização de um grande
sonho, o bem-estar.
O Autor
Albasini
Albino Andela
(Vassetetane wa Vasseteta Mahuaie)
Contactos: 823521970 / 842118038
/ 876583922
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